Friday, January 30, 2009

argumento sexta-feira 30

dona de casa de meia idade e cinco quilos acima do peso normal assiste a programa reality show. os dois filhos, de 3 e 5 anos estão dormindo. o marido está na zona, mas lhe dissera - e ela optou por acreditar - que ia na casa do primo jogar carta. sentada na frente da televisão, ela bebe vinho e começa a prestar atenção no drama de um dos concorrentes que tenta desesperadamente conquistar uma colega pela qual é rechaçado e ridicularizado. a mulher se compadece do rapaz, e, achando-o "bonitinho" pensa que se ele aparecesse em sua porta, ela cuidaria bem dele. como já bebeu 3 taças (os meninos foram dormir cedo) e se sente capaz de fazer algo emocionante, a dona de casa anonimamente cria um blog chamado "EU CUIDARIA DE VOCE" em que passa a expor sua simpatia pelo candidato coitadinho do programa. o blog de repente é descoberto por uma rede de fofocas que o expôe na mídia chegando inclusive a ser conhecido pelo participante confinado, que além de surpreso pela manifestação de carinho, passa a se sentir motivado, amado, querido, vencendo a maioria das provas e também passa a atrair mais atenção do público. o rapaz passa a mandar mensagens pelo programa para a dona de casa que responde através do blog. ele diz que quer conhece-la assim que vencer e sair do programa. ela desconversa. a mídia tenta desesperadamente descobrir a identidade dela, mas ela disfarça e avisa que nunca poderá se deixar identificar.
o rapaz fica em segundo lugar no programa e ao voltar pro mundo real quer realmente encontrar a interlocutora - no fim das contas ele nunca quis muito o dinheiro, queria realmente atenção;
passa a deixar mensagens para a dona de casa, que já meio assustada com a repercussão de sua brincadeira segue inventando motivos para não se identificar.
ela não sabe como lhe dizer que não era paixão. era só uma sexta-feira a noite em que ela estava sozinha e não tinha muito o que fazer.
os meios de comunicação mantém seu interesse em monitorar o blog e tentar descobrir quem é a fã anonima por mais um mês, depois ninguém mais se lembra da notícia.
o rapaz segue insistindo num encontro.
numa quarta-feira quente, os filhos na casa da avó e o marido pescando (no cassino), ela aceita encontrar-se com ele.

Thursday, January 29, 2009

sinopse de quinta-feira 29

velha muito velha, idade incontável, vestindo leve camisola sobre os ossos e escarras (decúbito da vida) passa noite inteira insone se virando na cama. de um lado para o outro. de um lado para o outro. das dez da noite as seis da manhã, nada mais além de virar-se de um lado para o outro.
quando o dia amanhece, a velha vagarosamente sai da cama, tira o colchão, leva para a frente de casa e toca fogo. fica lá assistindo, sozinha, ossuda, velha, leve camisola. manchas feridas pequenas, nas mãos e nos joelhos. de repente a porta da casa vizinha se abre e dela sai um adolescente encasacado e de mochila nas costas. ele está emburrado e assim que fecha a porta da casa, da uma espiada pras janelas da mesma e não vendo ninguem lá, pega um baseado no bolso do casaco. procura fogo. não encontra. ve a velha e a fogueira de colchão. estranha, mas precisa de fogo.
o jovem vai até lá, acende o baseado na pira funerária.
em tom de piada ele pergunta a velha se ela está queimando dinheiro.
ela responde que não. então ele ainda mais debochado pergunta se ela está queimando o colchão pra esquecer as fodas do passado. ela responde que já esqueceu.
o rapaz fica quieto, fumando.
ela pede um pega.ele dá, ela fuma. então ela diz:
só queimei porque deu vontade. já não durmo mesmo, deu vontade de queimar essa porcaria.
ela entra em casa. o rapaz entra atrás dela.

Tuesday, January 27, 2009

sinopse terça-feira 27

uma jovem mulher que recentemente teve a sua perna amputada por causa de uma infecção generalizada, passa a viver solitária, arrasada e descabelada.
um dia pela manhã encontra o único espelho que ainda guardava, um pequeno, antigo espelinho de bolsa que era da sua avó.
vendo-se desgrenhada, velha e deprimida, decide tentar reverter o quadro e retomar pelo menos uma parte de sua vida como era antes da amputação.
vai ao salão de beleza de costume, e onde antes era tratada como uma jovem poderosa e invejável, agora é recebida com pena e cuidados extremados por todos os atendentes e clientes.
em busca de retomar a auto-estima, resolve que ao invés de ser a criatura passiva, doce e gentil que sempre fora, se tornará cruel, arrogante e mesquinha, para que ao invés de pena, sintam e a tratem como alguém que teve o que merece.
Ela acaba se redescobrindo nesse novo modo de ser, sentindo prazer e recuperando assim o poder sobre si mesma.

Tuesday, January 20, 2009

sinopse de terça-feira 20

homem por volta de 42 anos, as sete e meia da manhã, lava o rosto, veste o uniforme cumprimenta todos os porta retratos de parentes mortos que tem espalhados pela sala e sai, como de costume, para tomar café da manhã na mesma padaria de sempre, mas ao atravessar a rua para chegar lá, é atropelado e quebra a perna. a motorista que o atropelou decide prontamente socorre-lo, coloca-o em seu carro e pergunta a qual hospital o homem prefere ser levado, ele responde que prefere ir onde ainda estiverem servindo café da manhã e que depois disso ele prefere uma carona direto pro trabalho porque tem uma lista inadiável de coisas por terminar no condomínio onde é zelador. a mulher, entre a graça e o assombro de estar conduzindo alguém tão simplesmente maluco, decide que irá ligar para o escritório e dizer que está doente e dedicar o seu dia a fazer o que o homem quiser.
ela o leva pra propria casa - o marido no trabalho, os filhos na escola - e lhe diz que estará ao seu inteiro dispor o dia inteiro.
nessa hora, o homem começa a gritar de dor
e implora que ela lhe leve ao hospital.
ela o deixa no pronto socorro, rouba uma caixa de calmantes, compra uma toalha xadres, e passa o resto do dia no parque, com comprimidos, uma garrafa de gim, deitada numa toalha xadrez, olhando pro céu, congratulando-se por conseguir não pensar em nada.

Thursday, January 15, 2009

sinopse de quinta-feira quinze

segurança de uma repartição pública passa 14 horas por dia sentado numa pequena cadeira em uma pequena mesa, sem poder ouvir música, sem uma televisão, sem ao menos poder ler alguma coisa. na parede a sua frente há somente uma planta que parece artificial (ele nunca descobre que ela é mesmo natural) e um quadro do tipo "arte abstrata" que parece ter sido pintado por uma criança chipanzé com todas as cores mais horríveis que sobraram entre as tintas da escola.
inspirado pela sonolência e pelo tédio, ele passa a se comunicar telepaticamente com a planta (que se transforma na mãe que ele perdeu aos 4 anos de idade)
e se apaixona perdidamente pelo laranja-avermelhado do quadro, mas este, infelizmente, parece dar atenção somente ao azul chumbo desbotado que está sobre si.
um dia, o segurança cansado de ter o seu amor não correspondido, tira toda a roupa
e se enterra no vaso.

Tuesday, January 13, 2009

nao quero falar sobre isso
quero embrulhar em papel presente um pouco melhor que barato;
ir empacotando enquanto no espelho vejo montes verdes escuros
montes de escuro verde escuro
há palavras que correm em busca de palavras
acima e abaixo de si
há palavras e montes de verdes escuros
no fundo vidrado do riacho

eu sou a possuidora e possessa da nuvem
de chumbo nágua
dos passos machucados
dos cacos de vidro no muro em que as crianças colhem os limões
na falta de açúcar
eu sou aquela do peito maquiado, tapumes com o desenho idílico
de que houve um coração.
eu sou magra e negra por dentro
uma nova espécie de formiga que não guarda
que não reina
que não transporta
só corta
e amarga
só corta
e amarga
para olhar pro céu.

Saturday, January 10, 2009

intimidade 1

é como tatear no escuro
uma tarde no gramado
dos fundos do mundo
todos os seus balões
festas que vc rezou pra não lembrar
tiros que em mim são mudos
em voce
basta regar.

Wednesday, January 07, 2009

de tarde eu não fui

foto by
"megatalentolinda"
tuane eggers

as rachaduras dos meus pés as vezes bem que podiam crescer até me engolir.
por deus, que feios, encardidos.
jesus, que irremediáveis.
secos, rotos, tortos, chatos. os dois
corações
pés da roça.
então me afundo mesmo
as vezes em dívidas
quase sempre dúvidas
as vezes a vida úmida
de tanto ir e voltar nas vontades.
sou do tipo que espera quem nunca disse que vinha,
do tipo que rega planta daninha
do tipo que rima pra fingir que é mentirinha
brincadeira de acordar
e não ver o mapa do lado de lá
me pedisse pra esperar
eu duvidava
gritasse pra me espantar
eu comprava
que sou ninguém
só um corvo
onde há pombos
eu queria/eu brincaria/eu faceira
eu partiria
de mim a ti
mas eu não sabia que era eu
porque os meus pés são feios
eu ando onde não faz dia

Tuesday, January 06, 2009

ouvindo pela vilionésima vez a mesma música
em todas as outras que eu repito
e repito
a mesma música
esperando de joelhos
que me encha o saco o refrão
de lembrar
pela soliloquésima frase
a nota interna
anterior
o nome
do que já passou

e poderia nem ter ido
e poderia nem ter guardado
os guardados

quando eu te conheci
onde é que estive
com a cabeça
e sem a pressa?

eu ligo o rádio
e conto as canções
que eu perdi

Monday, January 05, 2009

as flores na parede da cabeceira da cama foram coladas tortas, como um presságio - ou um aviso - sem querer

mas cada um com seu jardim

do som latido que vem de dentro da boca de um cao lá longe escuto o mar
do fundo da sua goela
lá longe
tem o mar.
sempre tem o mar
até pra quem já vive lá.

take only what you need from it
uso um espelinho pra recrutar uma imagem que sirva
de mim
compro um mapa instantaneo dos números das letras do dia do meu nascimento
misturo com as digitais que deixo onde eu não toquei
e tento
explicar
o que eu vi
e não notei
troquei o meu motor por uma sequencia de coraçõezinhos invertidos
que podiam virar cicatriz com o auxílio de um traço
um traço é sempre um risco
seguro até onde vai.
minha nova viagem é não me esconder atrás do sofrimento