Monday, March 13, 2006

Gentilmente sinistra,

Segunda-feira de manhã, eu fui acordando aos poucos e bruscamente desde as primeiras horas, lá pelas três. Quando não era o meu corpo tentando falir e eu juntando os pedacinhos com xarope, reza, chá e promessa de não fumar mais tanto ou não pegar frio ou parar de tentar agarrar a madrugada pelo rabo, era os mosquitos. Apareciam um por vez. Eu me enchia com o zumbido, levantava, ligava a luz, perseguia fraca e sonolenta, finalmente conseguia matar, aí aparecia outro. Eu desistia, tentava dormir, precisava dormir, depois repetia todo o processo.
Eu sentindo sono em todo o meu corpo, incluindo partes que não existem de fato, como aquelas que amam e se magoam e odeiam e esperam e mudam de idéia, e sentem saudade e se confundem.
Eu me sentindo fraquinha para todas as coisas, incluindo sentir frio e calor e optar por uma coberta ou suicídio com vento nas costas, já bastava já bastava.
Dormi bem, finalmente, entre as seis e as nove e meia da manhã. Levantei atrasada e com o cabelo mais feio do que eu poderia me importar, não sonhei com nada nem ninguém, não pensei em mais nada nem ninguém, não pesei porra nenhuma na minha consciência, mas saí da cama e debaixo do chuveiro lavei tudo isso e mais um pouco. Debaixo do chuveiro, eu só queria mesmo ter certeza de que essa moleza no corpo não vai me deixar desmaiar durante a tarde. E fingi que tirava com sabonete as dores guardadas por empréstimo debaixo de cada centímetro de pele.
Me sequei. Me vesti. Limpei as marcas e a tatuagem. Escolhi ouvir belle and sebastian, musiquinha pros novos romanticos cínicos. Aqueles que morrem de pulmão por descuido não por glamour. Aqueles que só não conseguem deixar de se pendurar num cigarro. Mas os motivos ainda são os mesmos, apesar de não acreditarmos neles.
Saí de casa com uma camiseta amarela extra na bolsa. Em caso de febre, eu quero poder voltar a estar seca. Saí de casa com belle and sebastian, gentilmente sinistra, gostando muito de ser capaz de me sentir assim.
Nada de mal faz mal demais, quando se tem um bolsinho interno no coração, e os segredos certos pra guardar, olhar de vezenquando, e sorrir porque é bom estar vivo, as vezes, com os minutos contados pra chegar.

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