Wednesday, March 08, 2006

de tarde, nós somos azuis e tudo bem

quase todos nós trabalhamos, mas poucos gostam mesmo disso. isso tem menos a ver com vontade de não fazer nada do que com a aparente impossibilidade de nos sustentarmos fazendo alguma coisa que nós gostamos. As vezes pode ser porque não temos os meios de atingir o glamour que a arte precisa, as vezes porque achamos que não vale a pena, as vezes porque não dá tempo, as vezes porque ainda não inventaram o que a gente gostaria de fazer. e ok. talvez a sequela também não ajude muito. eu sei do que estamos falando. quase todos nós trabalhamos, de um jeito ou de outro. nem que seja cuidando da casa e dos irmãos mais novos. por isso, de segunda a sexta, não podemos nos ver de tarde. ou não todos, ou quase nunca, ou muito pouco. Mas há uma rede de comunicações, por email, telefone, telepatia, mensagens, recados passados por telefone para alguém que por acaso estava do lado do amigo, de passagem, no intervalo, entre uma entrega e outra, entre uma azucrinação vespertina e cinco minutos de tédio, a uma, as tres, ou as cinco, quando der fome ou vômito ou nada de bom na televisão ou uma pilha de burocracia impossível, a gente nunca se vê de tarde durante a semana, mas de um jeito ou de outro estamos todos lá. nas tardes de segunda a sexta, os grupos mais próximos são diferentes; as presenças se alternam, as vezes não temos tanto tempo, eu sou sempre tão presente enquanto aguento. de tarde é que a gente vai construindo o castelinho de formigas pros dias de bonança. devagar, devagar, cuidamos de nos cuidar; uns dos outros, passinhos pequenos começam a correr maior na quinta-feira.
por aqui, o fim de semana é o indulto. e a gente se esforça por passar pedacinhos de papel por entre as celas durante a prisão.
e no meio desses buraquinhos, não só nas frestas das paredes, mas também nos espaços entre as palavras que nos mandamos, é que estão guardadas as coordenadas pra além das estepes. quando os fugitivos montam o acampamento, eles já sabem exatamente que dança, como, quando e com quem dançar. ainda que isso aconteça por conta do caos.

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