Wednesday, May 02, 2007

todas as coisas que acontecem por causa da piscina

Ele compra jóias pelo canal persa da televisão
Sua filha se inscreveu na pré seleção de um reality show pelo segundo ano consecutivo. Ano que vem vai ter que comprar pra ela.
Ano que vem ele queria se divorciar.
Agora não dá.
Sua esposa é viciada em coca light
Ele também suspeita que ela esteja trepando com atendentes de lojinhas 24 horas.
Alguém grita na frente de sua casa, “meg pecadinho, sua loca”.
Ele gostaria que meg pecadinho fosse sua amante, mas quis o destino que ela fosse sua filha.
Não que ele tenha tocado nela alguma vez, não não.
Ele não a merece. Ele só queria.
A parte mais ridícula....
A parte mais ridícula, é saber que existem milhares de vidas como a sua. Milhares de caras como ele, querendo as mesmas coisas que a grande maioria deles também não terá força de vontade o suficiente pra alcançar.
Só coçando o saco.
Aliás, há uma semana, ao invés de só coçar o saco, ele esfrega a mão lá. E naquele espaço entre o saco e o cu. Naquele corredor inútil. Imagina de deixaria alguém lamber lá, nem chegar perto, não importa o quanto digam que pode ser bom. Só ele bota a mão lá. Pegando cheiro. Pra depois espalhar seu cheiro de inutilidade pras mãos dos outros.
Como um cão que já não mija pateticamente tentando demarcar terreno.
Ele está assistindo, mas não prestando atenção, um programa sobre velhos que realizam feitos incríveis aos 80 anos. Tudo o que ele pode pensar é
Que bom
Que ele jamais teve a menor vontade se cuidar, porque de fato, ele não pretende existir aos 80.
Não há fatos extraordinários a vista pra ele.
Quando ele chegar aos 80, a filha vai estar um caco.
Pode ser filha
Pode ser o amor da vida dele
Mas também só vale enquanto os peitos souberem o seu lugar.
E cada cirurgia plástica diminui o valor de naturalidade da peça.

Ah ah ah, é impressionante como reduzimos os outros a pedaços de carne com validade, consumíveis ou não, aos quais teremos a graça de acessar ou não,
altamente perecível ao desejo.
O desejo altamente perecível. Tão perecível que come suas próprias tripas.
Tão perecível que só sobra uma idéia do desejo, nada que anime suas células, muito menos faça cócegas atrás do umbigo.
Mas, a parte mais engraçada no meio de tudo isso, é perceber que você é carne de quinta. E apesar do dinheiro que você tem, ele ainda não é suficiente pra te meter na terceira. Você é só um merda que na verdade deveria fingir pros outros e pra si mesmo que nem pensa nessas coisas, e de preferência que acha isso asqueroso.

A mulher chega em casa vestida de pistache. Ele achava que tinha passado a moda pistache. Desde a escola a mulher está sempre atrasada. Infelizmente nem isso nem todos os cosméticos a mantiveram jovem. O melhor que ela consegue fazer é parecer uma senhora senil agindo como uma criancinha imbecil. Por isso, só podem ser os atendentes de loja 24 horas. Ela não faria melhor do que isso.
Na cozinha, ela prepara um sanduíche com uma fatia de pão, meia de queijo e duas de alface. Muito séria, compenetrada em nada. Com as rugas de quem está sempre se ferindo, por querer, sem querer. Ele entra pra pegar outra cerveja e também porque ela esta lá. Sentia eventualmente alguma necessidade de interação. Nem que fosse uma simples troca de palavras pra garantir que a cidadã que dorme ao seu lado não anda tendo idéias violentas. Talvez ele estivesse enlouquecendo, mas sempre achou importante manter vigilância sobre as vontades da mulher.
Por deus, ela dormia com ele. Ou melhor, ele dormia ao lado dela.
E ele dormia bem. Ele gostava de estar dormindo.
Uma parede inteira da cozinha era feita de tijolos de vidro. É óbvio que só podiam se dar ao luxo de uma parede de vidro porque viviam num condomínio fechado com dobermanns e cerca elétrica. Aquilo tudo sempre lembrava o quanto ele também estava impedido de fugir. Ele odiava a parede de vidro que deixava sol de mais entrar na casa. Era tarde de sábado, como um inútil homem temporariamente liberado das suas obrigações, ele só queria um pouco de insignificância e escuridão.
Perto da janela, vestida de pistache, mordiscando um mini sanduíche, a mulher...a mulher parecia um pássaro radiativo,
Odeia a mulher odeia a mulher
Sem expressão alguma, a olha com uma garrafa na mão
Vendo-a como um pássaro radiativo
E odiando-a por causar aqueles pensamentos esquisitos.
Ela lhe dava vontade de aprender a jogar golfe e um bom álibi pra ter um taco.
Nessas horas, eu me sinto um moleque com raiva e ao mesmo tempo acho difícil de acreditar que já fui criança um dia.
- Hei querida, porque nós continuamos dormindo na mesma cama?
- pelo mesmo motivo que não me impressiona você estar me perguntando isso
E ela não estava impressionada
-pelo mesmo motivo que você ainda me chama de querida. E pelo mesmo motivo que continuaremos dormindo na mesma cama. Porque ambos sabemos bem o que acontece, porque temos dificuldade de mudar os hábitos e porque insistimos em ser cúmplices.
- Isso é bom?
- O que te parece? O que nós dois parecemos?Algo bom?
- Desde quando você fala assim?
- Desde sempre, mas normalmente tenho paciência de maquiar melhor.
- Hmmm. Você já reparou que as minhas mãos cheiram mal nos últimos tempos?
- Comentaram. Por aí. Comentam. Eu ainda não reparei.
- Você não fica triste?
Ela está longe da luz agora. Já não tilinta mais. De repente, parece até que já não há mais sol, nem luz.
- Triste? Porque não percebi que você fede?
- Não. Porque não nos aproximamos mais.
- Ou seja, você me pergunta de estou triste porque você não me dá oportunidade de perceber que fede?
- Talvez você goste do cheiro.
Por algum motivo, se sentiu impelido a enfiar a mão no nariz da mulher.
Ela saltou de lado e segurou com força a sua mão. Com força, toda a força do mundo
mas sem raiva.
- Você tem certeza de que quer que eu saiba a verdade sobre você a essa altura?
Ele sai da cozinha.
Vai ao banheiro e lava as mãos.
Ele volta.
-Ei, você foi gorda quando era adolescente, né? Aposto que passava a tarde inteira comendo porque era esquisita e não tinha amigas.
-Errado.
É, na verdade, ela comia a noite inteira.
-Você sempre foi compreensiva.
- E você sempre sonhou ser casado com a sua filha.
Ele não diz nada. Porque não era uma pergunta. Nem uma situação em que valesse a pena refutar.
- Você sabe querida, acho que ninguém invejaria a nossa vida.
-Fale por você. Eu acordo todos os dias sendo completamente feliz. Absurda e completamente feliz. Rotineiramente. Aliás, hoje é sábado, você podia me levar pra jantar.
Jantar. Sempre jantar. Outro jantar.Jantar é bom. Salão cheio de gente com grampos no rabo, sorrindo.
Amanhã
Ele vai acordar com azia,
Mas é domingo, ele tem o dia inteiro pra matar algum desconhecido.

1 Comments:

At 9:42 AM, Blogger Marcos Rohrig said...

perdão minha querida, mas eu sou preguiçoso, e vc sabe, entonces no vo ler cosas demasiadas grandes

 

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